A Igreja convida a nos colocar a caminho da Páscoa de Jesus, a festa mais importante de nossa fé cristã. Para tanto temos diante de nós um percurso de quarenta dias de caminhada, uma subida árdua, porém carregada de sentido, rumo a “Jerusalém”. Será um tempo de combate espiritual conosco mesmo, com tantas propostas que buscam nos desviar do caminho. Todo esforço será bem-vindo.
É preciso, porém, ir subindo com Jesus passo a passo, sem pressa. O ideal é chegar com Ele. Por isso, é de suma importância começar bem, com determinação; entrar nessa experiência com animo e liberdade. Não estamos sozinhos, Deus está conosco.
A Tradição cristã, desde as comunidades primitivas, na fidelidade a seu Senhor, nos anima a fazer memória desse grande acontecimento.
Os quarenta dias têm um sentido simbólico, remete a outros quarentas: quarenta dias de chuva no dilúvio, quarenta anos do povo no deserto, quarenta dias de Moisés no Monte Sinai, quarenta dias de caminhada de Elias no deserto, quarenta dias de Jesus no deserto. Agora, quarenta dias para nós que, rememorando a vida de seu Senhor, nos colocaremos a caminho com Ele. Nosso objetivo não é o deserto, mas queremos atravessá-lo para chegar à Páscoa. Quem nos incentiva nessa caminhada é o poeta e profeta Dom Helder Câmara:
É graça divina começar bem.
Graça maior é persistir na caminhada certa.
Mas a graça das graças é não desistir jamais.
Mais do que uma ocasião para penitência, jejum e oração, fortes apelos deste tempo, será uma oportunidade para realizarmos uma profunda experiência de comunhão com Jesus, fazendo memória dos mistérios de sua paixão, morte e ressurreição, bem como para solidarizarmos com todos aqueles que, não só neste tempo, vivem uma constante subida a “Jerusalém”.
Procuremos, ainda nessa caminhada, viver em espírito de comunhão com a Igreja que neste ano nos propõe como reflexão e oração a Campanha da Fraternidade Ecumênica com o tema “Fraternidade e Diálogo: Compromisso de Amor”, e o lema: “Cristo é a nossa paz: do que era dividido fez uma unidade” (Ef 2,14a).
Deixemos, pois, que esse apelo provoque em nós um desejo e disposição para adentrarmos nessa experiência com ânimo e liberdade. Tenhamos consciência de que, fazendo nossa caminhada pessoal e comunitária, vamos trazer no coração nossos irmãos e irmãs concretos, irmanados em Cristo, que também O tem como Salvador e Redentor, e outros tantos que padecem de males, violências, discriminação, falta de diálogo e abertura ao outro. Sejamos solidários com todos em Cristo.
O Deus que confessamos não é, infelizmente, o mesmo para todos: para uns é Vida, é Paz, é Solidariedade, constroem pontes; para outros é morte, divisão, separação, constroem muros. As desigualdades sociais permanecem teimosas e criam cidadãos de segunda, terceira, quarta categoria. Na Igreja não há excluídos, pois somos irmãos e irmãs, iguais diante do Pai. E o maior é o que mais serve aos outros.
Contemplando os desajustes sociais nós nos questionamos pela qualidade da fé que professamos. Fé e vida não podem andar separadas, pois quem acredita também ama!
Uma pergunta brota espontaneamente: A sociedade que temos é a que queremos como cristãs e cristãos? O amado Papa Francisco profeticamente disse: “Digamos não a uma economia de exclusão e desigualdade social” (Evangelii Gaudium – EG 53). “A economia especulativa faz pobres cada vez mais pobres, e isso é inaceitável” (Audiência pública de 15/06/14).
Mesmo na Igreja, infelizmente, encontramos algumas sombras que ainda devem ser iluminadas pela Boa-Nova de Jesus. O clericalismo, o fundamentalismo, existente não podem abafar a igualdade de gêneros, nem a responsabilidade dos leigos nos organismos eclesiais (Cfe EG 52).
Neste tempo de Quaresma, reformulemos nossas limitações e exclusões com gestos positivos que ajudem a construir uma Igreja mais evangélica e uma sociedade mais fraterna, justa, solidária, pacífica e acolhedora ao diferente, aberta ao diálogo.
O tempo da Quaresma é um caminho privilegiado para a Páscoa do Senhor. Na Vida, todos somos peregrinos ruma à casa do Pai. Nessa estrada, encontramos pessoas diferentes, mais por dentro do que por fora. A disparidade interna é tão profunda que marca indelevelmente a vida e a história e, por conseguinte, a sociedade e a Igreja. Há pessoas que carregam séculos de pobreza e outros séculos de prepotência. Hoje, isso é inadmissível!
Que esse tempo quaresmal, seja verdadeiramente transformador na nossa vida, seja um divisor de águas, entre aquilo que éramos, e o que seremos a partir de agora, com o olhar fixo em Jesus, em unidade na diversidade, em comunhão com todas e todos, pois diante do Pai, somos um único povo, praticantes do amor que Ele nos ensinou: “Amai-vos uns aos outros, como eu vos amei.” (Jo 13,34).
4 respostas em “Entrando com ânimo e liberdade na Quaresma”
Palavras que;
Ensina,motiva,alimenta e traz reflexões
Paz e Bem.
Gratidão em trazer para nós estás palavras.
Reflexão e posicionamento na Quaresma.
Abraços fraterno Valquiria e Brayan!
Quantos ensinamentos riquíssimos, se apresentam neste sábio Texto, em especial quando se refere aos quarenta dias, com significados pertinentes, para refletirmos a Vida do Senhor e assim nos fortalecer para seguirmos os Caminhos de Cristo, em Espírito de Comunhão com a Nossa Igreja, focando o Tema e o Lema da CF, que ressalta o Amor do Nosso Papa Francisco, por uma Igreja ou mesmo uma Sociedade Ecumênica, envolvida no Amor ao Próximo, como Deus nos ensinou!
A divina Ruah cada vez mais sopra os ventos do encontro e do pão partido e repartido, mesmo quando vivemos tempos tão sombrios, temos neste tempo quaresmal que se aproxima a oportunidade de reencontrar forças para bem perseverar sempre.