Na chácara, onde passo alguns fins de semana, encontrei uma forma interessante de interagir com a netinha:
- Lançar no gramado alimento para os passarinhos;
- Ficar de butuca aguardando os pardais, rolinhas e canarinhos aterrissarem para se empanturrarem e encherem o papo e.
- Fotografá-los ou filmá-los durante o regabofe.
Virou aprendizado ecológico, logístico e artístico. Pura diversão.
Do vasilhame que guarda o alpiste e rações para pássaros retiro porções e as coloco nas pequenas mãos da netinha que esparrama um pouco em cada pedacinho do campo que acha conveniente. De vez em quando, me consulta: – Pode ser aqui? E obedece sempre a minha recomendação, sem contestar. Eu me sinto uma importante autoridade. Até acredito e fico todo orgulhoso.
Uma vez ou outra ela cisma de brincar com os passarinhos quando estão “bicando” os grãozinhos do saboroso alimento. Eles ainda não a entendem e se assustam. Fogem para os galhos das árvores que circundam a área. Ela fica sem entender, só queria fazer-lhes companhia.
Minha esposa interage com os netinhos plantando mudas de babosa, pitaya, romã, limão, lichia e outras frutíferas. Rega-as e com a mangueira banham-se também e fazem do trabalho atividade de lazer, aprendizado e ação comunitária.
Colher flores a cada dia para colocar no vasinho dedicado a Nossa Senhora Aparecida virou uma rotina prazerosa. Sempre acompanhada da inocente pergunta: – Mamãe do céu, você gostou?
De mãozinhas postas, os netinhos rezam a oração infantil, cuja origem remonta há mil anos, reconhece o nosso anjo da guarda e pede a sua ajuda em nossas vidas:
“Santo Anjo do Senhor,
Meu zeloso guardador,
Se a ti me confiou a piedade divina,
Sempre me rege, me guarda, me governa, me ilumina.
Amém!”
A parte “Se a ti me confiou” é a que apresenta a maior dificuldade. A netinha balbucia: “Se a nini nini não”. Todos riem, ela acha graça e ri distribuindo simpatia.
É muito bom sentir a iniciação no mundo da oração desde a mais tenra idade.
Certa vez, encontrei entre os alpistes e outras sementes e granulados, um pedacinho de filó e me lembrei de uma ferramenta construída pela esposa para falar, nos encontros de evangelização, sobre a fé.
Você já pegou uma semente de mostarda deslizando-a entre os dedos, como se faz com as contas do rosário?
Não há como pensar na expressão Reino de Deus, sem nos lembrar da parábola da semente e do fermento.
A semente, minúscula, inexpressiva, lançada em terra boa faz nascer uma árvore. Sob os galhos, a sombra. Nesta o lavrador descansa. Os pássaros encontram abrigo em sua copada.
Não se veja em todo o processo, pressa. Nem passividade. Tudo bastante dinâmico. Vitalidade contínua, crescente.
Sob o impulso do fermento, a massa cresce. Desenvolve-se até chegar ao ponto desejado. Tudo no seu devido tempo, sem pressa também. Nada se faz de repente, não mais que de repente.
Em ambas as situações o tempo faz-se importante. Os olhos não enxergam. Desaparece a semente na terra e o fermento na massa. A força vital que carregam, em si, atua. Sem estardalhaço, no silêncio fecundo de suas existências, o crescimento acontece. Pronto!
Da semente aparentemente falecida, desaparecida, germina e brota a plantinha.
No início, tenra, depois, contínuo crescimento até a idade e tamanho adultos. Pode até servir de abrigo aos pássaros!
Confunde-se o fermento com a farinha, parece perder a identidade. No entanto, a massa acusa o efeito do fermento e aos poucos cresce. Presentes mistério de vida e aparência de morte.
O Reino de Deus encontra explicação na parábola da semente e do fermento. Pequeno no início, alimentado pelas ações de boa vontade, transforma e produz frutos, no tempo certo! É certo o esplendor do resultado!
Outra ideia suscitada: cada um, na simplicidade, na humildade, apequenando-se qual semente na terra boa ou misturando-se qual fermento na massa, pode ser instrumento de vitalidade, força e crescimento para a construção do Reino de Deus. Do Reino presente, aqui e agora, ao alcance da nossa capacidade de servir e amar.
Sem medos.
Sem reservas.
Coragem, fé e eternidade.
À frente, a verdade!
20 respostas em “Simplicidade: via de acesso a Deus”
Bom dia a todos e a todas que leem as crônicas e não poderia ser diferente ao cronista. -Mais que prazer diria (R. Carlos Braga) e, faço jus à chave do rei; de fato se percebe com quanto carinho o Sr. Irineu nos comunica, há sempre bons motivos para entrarmos no texto. Regabofe, simplicidade, semente, fermento, crianças e sempre Deus protagonista.
Obg, caro irmão Irineu
Querido Irinas.
Parabéns pela escrita, conto maravilhoso, me remeteu a momentos vividos.
Estou esperando seu livro.
Bjs no coração meu irmão.
Muita LUZ pra você e família
Olá Irineu esta narrativa da sua cronica surgiu como um balsamo dentro deste contexto que estamos vivendo…lendo consigui visualizar o cenário e sentir cada detalhe que descreveu com propriedade…es o dom dos escritores capaz de levar o leitor na cena e faz nos sentir como parte desta narrativa.Penso que a nossa intimidade com Deus transparece na simplicidade no contato com a natureza,na ternura e inocência da criança…Ao ler e refletir sobre a sua cronica senti-me em estado de graça até parecia que estava rezando o Cântico em tempo de festa ( Dn 3,57-88.56) e perceber no nosso cotidiano a maifestação de Deus.Obrigada por esse momento de comunhão e partilha.
Paz e bem! Meu amigo e irmão em Cristo
Emocionante comentario, irmã Caritas!
Nossa. Parece que vi os passarinhos virem comer, a netinha, a alegria, ouvi os risos. Ah que delícia. A inocência que coisa sagrada
Que bom ler seu comentário. Obrigado Ana!
Quanta inspiração sr Irineu
E aí, eu vejo que meu esposo tem razão, temos um sítio pertinho da cidade, sempre me convida pra ir com ele só pela companhia enquanto ele faz a *labuta* dele…
As vezes vou…e vivo tudo isso…
Em toda a simplicidade enxergo Deus…🙏🙏🙏🙏
Obrigado amiga!
Muito lindo sua expressão em palavras de um cotidiano. Você nos passa todo o sentimento do momento com muito amor, carinho e compreensão. Parabéns!!!
Obrigado Vanessa.
A cada nova crônica surge uma nova inspiração, desta vez acompanhada de uma tremenda admiração e que, ao final, beira à perfeição. Relato fidedigno de uma testemunha ocular. Parabéns!
Obrigado Rodrigo.
Quanta alegria ao ler essa crônica! Deus o abençoe, pelo carinho conosco e por esse dom, de descrever os sentimentos em palavras tão lindas! Beijo grande 🙏😘
Obrigado Mari.
A melhor sobre essa parábola que já li ou ouvi!
Parabéns!
Obrigado querida cunhada.
Você tem o dom das palavras e sentimentos sabendo sempre ter uma palavra de carinho obrigada ter vcs como amigos e poder ler suas crônicas
Obrigado como sempre!
Como sempre excelente.
Obrigado como sempre!